ACÓRDÃO Nº 000114/2020 PROCESSO Nº 1024042017-9
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
Processo Nº 102.404.2017-9
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente: PANDINE ALIMENTOS LTDA. - EPP
Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS
Preparadora: UNIDADE DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA SEFAZ - CABEDELO
Autuante: FRANCISCO DE ASSIS LEMOS DE SOUZA FILHO
Relator: Cons.º ANISIO DE CARVALHO COSTA NETO
INOBSERVÂNCIA DE DEVERES INSTRUMENTAIS. OMISSÃO NA ESCRITURAÇÃO FISCAL DIGITAL. NULIDADE. ERRO NA DESCRIÇÃO DOS FATOS E NA NORMA LEGAL INFRINGIDA. VERIFICAÇÃO DE OFÍCIO. FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS. DENÚNCIA CONFIGURADA. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. MANTIDA DECISÃO RECORRIDA. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.
A aplicação da lei no tempo exige a autuação, para um mesmo fato – falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios -, de duas infrações distintas: omissão na EFD e falta de registro dos documentos fiscais no Livro Registro de Entradas, com aplicação de distintas penalidades. Ocorre que, para contribuintes que apresentem as declarações da movimentação de mercadorias através de GIM não se aplica a acusação de omissão na EFD, implicando em nulidade do auto de infração, verificada de ofício.
Para o acusado, é procedente o auto de infração na parte em que é acusado de falta de lançamento de notas fiscais no Livro Registro de Entradas.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o voto do pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e, no mérito, pelo seu desprovimento, para manter, a sentença prolatada na primeira instância, julgando parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.0001483/2017-53, lavrado em 27/6/2017, em desfavor da empresa PANDINE ALIMENTOS LTDA. - EPP, inscrição estadual n° 16.132.229-8, devidamente qualificada nos autos, impondo o ônus decorrente desta ação fiscal, condenando-o ao pagamento do crédito tributário no valor de R$ 321,33 (trezentos e vinte e um reais e trinta e três centavos) referentes à multa por descumprimento de obrigação acessória por infringência ao artigo 85, II, “b”, da Lei n. º 6.379/96.
Ao tempo em que mantenho cancelado o crédito tributário no montante de R$ 2.089,73 (dois mil e oitenta e nove reais e setenta e três centavos), pelos motivos já expostos.
Intimações necessárias a cargo da Repartição Preparadora na forma regulamentar.
P.R.I.
Primeira Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 2 de junho de 2020.
ANÍSIO DE CARVALHO COSTA NETO
Conselheiro Relator
GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, GÍLVIA DANTAS MACEDO, MÔNICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS e THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA FONSECA.
SÉRGIO ROBERTO FÉLIX LIMA
Assessor Jurídico
Relatório
Neste colegiado examina-se o recurso voluntário, nos moldes do artigo 77 da Lei nº 10.094/2013, diante da decisão monocrática (fls. 31-40) que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001483/2017-53, lavrado em 27/6/2017, (fls. 3-4), no qual constam as seguintes infrações fiscais:
“0537 – ESCRITURAÇÃO FISCAL DIGITAL - OMISSÃO – OPERAÇÕES COM MERCADORIAS OU PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS >> O contribuinte está sendo autuado por deixar de informar ou ter informado com divergência na forma e prazo regulamentares, em registros do bloco específico de escrituração os documentos fiscais da EFD, relativo às suas operações com mercadorias ou prestações de serviços.”
“NOTA EXPLICATIVA – Informações da base de cálculo para cobrança dos 5% do valor do documento ou diferença encontrada, mensalmente, constante na planilha relação de NFES não lançadas, conforme art. 81-A,V, “a” 5%.”
“0171 - FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS NO LIVRO DE REGISTRO DE ENTRADAS >> O contribuinte está sendo autuado por descumprimento de obrigação acessória por ter deixado de lançar as notas fiscais correspondentes às mercadorias recebidas ou às prestações efetuadas nos livros fiscais próprios.”
“NOTA EXPLICATIVA – Informações do valor total por documento de cada mês, constante na planilha relação de NFES não lançadas, conforme art. 85-II, B 3UFR.”
O representante fazendário constituiu o crédito tributário, dada a infringência aos artigos 4º e 8º do Decreto n. º 30.478/2009 e art. 119, VIII, c/c art. 276, ambos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto n. º 18.930/96, sendo proposta aplicação da penalidade no montante de R$ 2.411,06 (dois mil, quatrocentos e onze reais e seis centavos), a título de multa por descumprimento de obrigação acessória, arrimada nos artigos 81-A, V, “a” e 85, II, “b”, todos da Lei nº 6.379/96.
Regularmente cientificado na forma pessoal em 6/7/2017 (fl. 4), a empresa autuada apresentou reclamação (fl. 15-26) em 3/8/2017 (fl. 14), na qual se insurge contra os termos da autuação sob reproche com base nos seguintes fundamentos:
- que o dispositivo invocado como fundamento elenca informações que devem constar do arquivo magnético para identificação da matéria tributável;
- que nada foi dito sobre o fato imputado como ilícito;
- que a descrição da infração está em desacordo com os fundamentos legais, resultando em nulidade;
- que a multa aplicada é inconstitucional, dado seu caráter confiscatório;
- que existem duas previsões legais de penalidade, devendo ser aplicada a menos severa;
- que não há prova do cometimento das infrações, motivo pelo qual deve se reconhecer a improcedência do auto de infração;
- que não há termo de início e nem de encerramento da fiscalização.
Por fim, requer a revisão da autuação em decorrência dos motivos expostos na sua peça reclamatória.
Com informação de inexistência de antecedentes fiscais (fls. 29), foram os autos conclusos à instância prima (fls. 28), ocasião em que o julgador singular – Lindemberg Roberto de Lima – em sua decisão, manifesta-se pela procedência parcial do auto de infração por descumprimento de obrigações acessórias, impondo ao contribuinte parte do ônus decorrente da ação fiscal, conforme ementa abaixo:
PRELIMINARES. REJEITADAS. DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES ACESSÓRIAS. ESCRITURAÇÃO FISCAL DIGITAL OMISSÃO- OPERAÇÕES COM MERCADORIAS OU PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS. VÍCIO FORMAL NA PEÇA ACUSATÓRIA. NULIDADE. FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS NO LIVRO REGISTRO DE ENTRADAS. INFRAÇÃO CONFIRMADA.
- Afastada a preliminar de nulidade da peça acusatória por cerceamento de direito de defesa, aventada pela suplicante, devido ao fato do Termo de Início e de Encerramento de Fiscalização não serem obrigatórias ao procedimento realizado.
- Rejeitada a preliminar de nulidade por ausência de requisitos do auto de infração, pois o auto de infração deve ser analisado conjuntamente com os anexos acostados pela fiscalização para fazer prova da infração fiscal apurada. Estes autos foram instruídos com a relação de notas fiscais não lançadas, provas suficientes da acusação fiscal.
- Verificada ex officio a nulidade dos lançamentos de jan., mar., mai., jun., jul., ago., nov. e dez de 2013, pois para estes períodos não houve infração à falta de registro de notas fiscais na Escrituração Fiscal Digital, por descumprimento das normas do art. 81-A, V, alínea “a” da Lei 5.379/96, uma vez que o contribuinte só passou a ser obrigado à EFD em 1/1/2014. In casu, a legislação corretamente aplicada é a do art. 85, II, alínea “b”, que traz um previsão de multa de 3 (três) UFR-PB, por documento não lançado no Livro Registro de Entradas, em atendimento ao princípio do tempus regit actum.
- Confirmada as irregularidades fiscais caracterizadas pela ausência de lançamento de documentos fiscais nos Livros de Registro de Entradas, conforme a legislação vigente, incide a penalidade acessória pelo descumprimento da obrigação de fazer.
AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.
Regularmente cientificado da decisão de primeira instância administrativa através de Aviso de Recebimento (A. R.) – fl. 43 (RA977559277BR) -, em 25/4/2019, o autuado apresentou recurso voluntário (fls. 48.A-58) ao Conselho de Recursos Fiscais em 21/5/2019 (fl. 48), no qual se insurge contra os termos da decisão de primeira instância sob os seguintes fundamentos:
- que o auto de infração é nulo por erro na determinação da matéria tributável, tendo sido incluídas informações genéricas no campo destinado à descrição da infração, assim como os artigos 4º e 8º do Decreto n. º 30.478/2009 obriga que se insiram no arquivo magnético várias informações, que deveriam ter sido descritas pela autoridade fiscal;
- que, na imprecisão, não se tem a certeza de quais prazos e formas foram descumpridos, além de não se saber quais registros do bloco específico de escrituração e quais os documentos fiscais da EFD;
- que a multa aplicada tem caráter confiscatório, sendo inconstitucional a disposição do artigo 81-A, da Lei n. º 6.379/96;
- que há dupla previsão legal para a penalidade descrita, devendo ser aplicada a menos gravosa;
- que o auto de infração é improcedente por ausência de provas das acusações feitas;
- que não houve juntada aos autos dos Termos de Início e de Encerramento da Fiscalização, tendo prejudicada a defesa quanto à compreensão da matéria tributável, sendo nulo por essa razão;
Por fim, requer o recebimento e processamento do Recurso Voluntário, julgando pelo total provimento, para alterar a decisão recorrida, declarando improcedente o lançamento de ofício.
Na sequência, os autos foram remetidos a esta Casa, com distribuição a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para o fim de apreciação e julgamento.
Este é o relatório.
VOTO |
Trata-se de recurso voluntário, nos moldes do que dispõe o artigo 77 da Lei n. º 10.094/2013, interposto contra decisão de primeira instância que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.00001483/2017-53, lavrado em 27/6/2017 (fl. 3-4) em desfavor do contribuinte PANDINE ALIMENTOS LTDA. - EPP, inscrição estadual n. º 16.132.229-8, já devidamente qualificado nos autos.
DAS NULIDADES
O contribuinte, nos aspectos que dizem respeito à nulidade do lançamento, alega que a infração foi descrita de forma genérica, no sentido em que não consta no processo qualquer conteúdo elucidativo a respeito das acusações que lhe foram dirigidas. Ouso discordar do recorrente porque do auto de infração é possível extrair todos os elementos de fato narrados na peça acusatória.
Ora, não é matéria desconhecida. Muito pelo contrário. Ao omitir do conhecimento do Fisco estadual a aquisição de mercadorias e cujas notas fiscais deixou de lançar na sua escrituração fiscal, incorreu na infração de deixar de cumprir as determinações dos artigos 4º e 8º do Decreto n. º 30.478/09, assim como dos artigos 119, VIII, c/c 276, ambos do RICMS/PB, como facilmente se extrai do lançamento de ofício.
Portanto, a princípio, não há qualquer erro na determinação da matéria tributável. A conduta é flagrante. A relação das notas fiscais é prova mais do que robusta a apresentar ao autuado os contornos da conduta tida como infração à legislação em vigor, razão por que não merece guarida a tese de que há informação genérica.
Portanto, é de se espantar que, diante da clareza semântica disposta no auto de infração, tal alegação seja assumida pelo contribuinte, já que as informações que alega não terem sido incluídas no arquivo magnético pelo auditor fazendário, é de obrigação do contribuinte apresentar à apreciação do Fisco, seja através de GIM ou de EFD, a depender do período a que se refira.
E é exatamente desta matéria que trata este processo: auto de infração lavrado contra o contribuinte por descumprimento de obrigação acessória de lançar nos livros próprios as notas fiscais de aquisição, sendo aplicadas as penalidades previstas nos artigos 81-A, V, “a” e 85, II, “b”, todos da Lei nº 6.379/96.
Por esse mesmo motivo é que não pode prosperar a alegação de que a acusação é genérica. Muito pelo contrário. Diante de uma legislação que já está em vigor há mais de cinco anos, os termos das normas vigentes já deveriam ser de conhecimento dominante do contribuinte, razão pela qual alegar acusação genérica demonstra que o autuado deixou de observar os documentos acostados ao processo.
Qualquer desventura que nos leve a passear pelas folhas do processo vai nos conduzir às páginas do processo, nas quais consta relação esmiuçada dos documentos objeto do auto de infração em litígio, sendo possível, facilmente, deslindar o motivo do libelo acusatório. O contribuinte deveria, sim, provar que os documentos acostados à relação referida (cuja chave de acesso está disposta para cada um deles) foram lançados da sua escrita fiscal e/ou contábil, o que não fez, razão pela qual a alegação de nulidade é inverossímil.
No mesmo sentido, não se deve abrigar as considerações a respeito de que não se tem certeza de quais prazos, formas e documentos da EFD se tratam. Ora, os prazos estão dispostos na legislação e, em se tratando de ICMS, com periodicidade mensal, com entrega aventada no tempo em que o RICMS/PB, assim como sabido de todos. O próprio Decreto n. º 30.478/09 explicita o layout a partir do qual as informações devem ser prestadas.
Sendo, por essas razões, uma acusação precisa, e observante às disposições do artigo 142, do CTN, atendeu aos comandos constitucionais da ampla defesa e do contraditório, além do devido processo legal, já que colocou à disposição do contribuinte os elementos do auto de infração, em conformidade com a norma referida, senão vejamos:
Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Pelas mesmas razões, é de se constatar, diante da peça acusatória, que a fiscalização descreveu adequada e suficientemente, as disposições normativas constantes da legislação do ICMS na Paraíba, colocando ao seu dispor informações mais do que bastantes para que pudesse se contrapor às acusações constantes do processo.
E também não se diga aqui, por tudo posto, que se estaria a exigir comprovações através da prova negativa (diabólica) do contribuinte. O que se exige é que, diante da robusta plêiade comprovativa elaborada pela fiscalização, que o contribuinte, além das alegações, faça prova de que lançou os documentos fiscais diante da acusação de que não o fez. Em contraposição, apenas alegou.
Por isso é que a essa alegação deve-se despender um pouco mais de energia. Não é prova negativa que se pede. É demonstração positiva de que lançou as notas fiscais que foram emitidas em seu desfavor no Livro Registro de Entradas cuja comprovação se estabelece nos autos. E realce-se: se alguém de má-fé emitiu-as, que adote os procedimentos cíveis e penais cabíveis para responsabilizar os supostos infratores. Sua conduta letárgica só pode levar a Administração à conclusão de que se conformou com as circunstâncias fáticas e jurídicas, cujos efeitos se centram na responsabilização pelas infrações constatadas.
Ocorre que, é preciso reconhecer que erros cometidos na lavratura do lançamento de ofício, especialmente quando convirjam para nulidades deve ser reconhecida de ofício, assim como estabelece o artigo 16 da Lei n. º 10.094/13:
Art. 16. Os lançamentos que contiverem vício de forma devem ser considerados nulos, de ofício, pelos Órgãos Julgadores, observado o disposto no art. 15 desta Lei.
Nesse sentido, com informações colhidas no Sistema ATF da Secretaria se chega à conclusão que, no exercício de 2013, o contribuinte declarava suas informações através das GIMs, tendo migrado para o sistema de EFD somente a partir de janeiro de 2014. Dessa forma, vislumbram-se vícios na acusação que são passíveis da decretação de nulidade por erro na descrição dos fatos e na norma legal infringida, assim como estabelece os artigos 16 e 17 da Lei n. º 10.094/13:
Art. 16. Os lançamentos que contiverem vício de forma devem ser considerados nulos, de ofício, pelos Órgãos Julgadores, observado o disposto no art. 15 desta Lei.
Art. 17. Está incluído na hipótese prevista no art. 16 desta Lei, o Auto de Infração lavrado em desacordo com os requisitos obrigatórios estabelecidos no art. 142 do Código Tributário Nacional, quanto:
I - à identificação do sujeito passivo;
II - à descrição dos fatos;
III - à norma legal infringida;
IV - ao nome, ao cargo, ao número de matrícula e à assinatura do autor do feito;
V - ao local, à data e à hora da lavratura;
VI - à intimação para o sujeito passivo pagar, à vista ou parceladamente, ou impugnar a exigência, no prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir da data da ciência do lançamento.
De acordo com o perfil do contribuinte e com as modificações promovidas na legislação tributária, ele deveria ter sido acusado da infração de código 0171 – falta de lançamento de notas fiscais no Livro Registro de Entradas – em todo o exercício de 2013 e da infração de código 0537 – Escrituração Fiscal Digital Omissão – Operações com Mercadorias ou Prestações de Serviço – em todo o exercício 2014, em que se encontrou irregularidades.
Percebe-se, portanto, para os períodos de janeiro, março, maio, junho, julho, agosto, novembro e dezembro de 2013, pelos erros já apontados no auto de infração, deve se reconhecer o vício e decretar sua nulidade, mesmo que a isso o contribuinte não tenha se referido. Acosto-me, portanto, à decisão do julgador singular, afastando os créditos tributários referentes a esses períodos.
Em outro ponto das nulidade alegadas pelo contribuinte, deve se ter clara a compreensão de que Termos de Início e Encerramento de Fiscalização, malgrado sua obrigatoriedade de lavratura, não são elementos constitutivos do crédito tributário. É o lançamento tributário a peça inaugural da relação obrigacional que se posta entre contribuinte e Fazenda Pública, não sendo sua não apresentação motivo de nulidade, assim como quer pretender o contribuinte.
A Ordem de Serviço Específica (fls. 8-9) emitida em favor do auditor fazendária pela SEFAZ é suficiente para conceder prerrogativa ao servidor para que ele se dirija ao contribuinte para iniciar o procedimento de fiscalização, não sendo crível acreditar que sua supressão – dos Termos de Início e Encerramento – seja motivo suficiente para que se reconheça qualquer nulidade.
Os elementos de informação de que precisa o contribuinte para exercer seu direito à ampla defesa e ao contraditório estão todos disponíveis no lançamento de ofício, esse sim a peça basilar constitutiva do crédito tributário e declaratória da obrigação – em sua dupla faceta - que nasce com sua lavratura, assim como estabelece o CTN em seu artigo 142:
Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.
MÉRITO
Em primeiro plano, assim como alegou o contribuinte, se deve reconhecer a tempestividade do recurso, em razão do próprio encadeamento de atos que se seguiram à ciência, por parte do contribuinte, da decisão de primeira instância.
ESCRITURAÇÃO FISCAL DIGITAL – OPERAÇÕES COM MERCADORIAS OU PRESTAÇÕES DE SERVIÇO
1ª e 2ª ACUSAÇÕES
Em relação a esta acusação, já´reconhecida a nulidade pelos vícios cometidos no lançamento e sobre os quais já nos referimos, não há nada mais a destacar para além de considerar toda a autuação em relação a este litígio indevido, devendo se afastada a acusação.
FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO
Em relação a essa acusação, sabe-se que a condição de contribuinte do ICMS no Estado da Paraíba impõe a todos enquadrados em tal circunstância uma série de obrigações, sejam de natureza principal, sejam de natureza acessória. Uma das quais é o efetivo e regular lançamento, nos livros próprios, das notas fiscais de aquisição de mercadorias no respectivo Livro Registro de Entradas.
Para que esteja em plena observância com as disposições da legislação em vigor, o contribuinte precisa escriturar uma série de livros fiscais previstos para o efetivo controle da Administração Fazendária, sem prejuízo da obrigação de emitir os documentos fiscais sempre que obrigado. Isso é entendimento que se depreende das disposições do artigo 119, VIII, do RICMS, ao regulamentar aos deveres instrumentais a que estão obrigados os contribuintes do ICMS no estado da Paraíba:
Art. 119. São obrigações do contribuinte:
[...]
VIII - escriturar os livros e emitir documentos fiscais, observadas as disposições constantes dos Capítulos próprios deste Regulamento;
[...]
Aliás, a escrituração do Livro Registro de Entradas é de obrigatoriedade só excepcionada para específicos contribuintes que, em condição de hipossuficiência, situam-se em circunstância especial, o que para o denunciado não ocorre. Assim, persiste, para ele, a obrigatoriedade de escriturar o referido livro, nele devendo, obrigatoriamente, lançar todas as notas fiscais de compra de mercadoria – tributáveis ou não. É inteligência que se depreende do artigo 267 do RICMS:
Art. 267. Os contribuintes e demais pessoas obrigadas à inscrição deverão manter, em cada um dos estabelecimentos, os seguintes livros fiscais de conformidade com as operações que realizarem:
I - Registro de Entradas, modelo 1;
II - Registro de Entradas, modelo 1-A; (grifo nosso)
III - Registro de Saídas, modelo 2;
IV - Registro de Saídas, modelo 2-A;
V - Registro de Controle da Produção e do Estoque, modelo 3;
VI - Registro de Impressão de Documentos Fiscais, modelo 5;
VII - Registro de Utilização de Documentos Fiscais e Termos de
Ocorrências, modelo 6;
VIII - Registro de Inventário, modelo 7;
IX - Registro de Apuração do ICMS, modelo 9;
X - Livro de Movimentação de Combustíveis;
XI – Livro Caixa.
Ora, a obrigatoriedade de escrituração do livro registro de entradas envolve outra obrigação: a de manter nele todos os registros de aquisição de mercadorias com a qual o contribuinte transacione em referido período, de acordo com o que estabelece o artigo 276 do RICMS:
Art. 276. O Registro de Entradas, modelos 1 ou 1-A, Anexos 24 e 25, destina-se à escrituração do movimento de entradas de mercadorias, a qualquer título, no estabelecimento e de utilização de serviços de transporte e de comunicação. (grifo nosso)
Da parte grifada do texto extrai-se que a obrigatoriedade se estende a qualquer tipo de aquisição, não importando se a aquisição se destina à revenda, ativo fixo ou consumo. Pouco importa. Adquiriu mercadorias ou contratou serviços gravados pelo tributo estadual, nasce a obrigação de lançar no livro registro de entrada.
A omissão se reflete em aplicação de penalidade cujo contorno pecuniário está previsto no artigo 85, II, “b”:
Art. 85. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso I, do art. 80, serão as seguintes:
[...]
II – de 03 (três) UFR-PB:
[...]
b) aos que, sujeitos à escrita fiscal, não lançarem as notas fiscais correspondentes às mercadorias recebidas ou às prestações efetuadas nos livros fiscais próprios, por documento;
Deveria, portanto, o contribuinte produzir prova de que não praticou a infração, de olho nas circunstâncias em que cabe ao contribuinte a prova em contrário, seja por dispor de muito mais condições de fazê-lo, seja por ser o interessado com mais disposição sobre a documentação fiscal e contábil, reflexa do seu movimento diário de mercadorias, objeto de seu estatuto social; seja por gozar de presunção relativa, o lançamento tributário. Assim se posiciona o CRF em diversos julgados, a exemplo do Acórdão n. º 407/2019:
Acórdão 407/2019
ÔNUS DA PROVA. INVERSÃO. FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS. INDICAR COMO ISENTAS, NÃO TRIBUTADAS OU SUJEITAS À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, OPERAÇÕES DE SAÍDAS DE MERCADORIAS SUJEITAS À INCIDÊNCIA NORMAL DO IMPOSTO. DENÚNCIA CONFIGURADA. PROVAS ACOSTADAS AOS AUTOS EMPRESTAM CERTEZA E LIQUIDEZ AO CRÉDITO TRIBUTÁRIO LEVANTADO. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. MANTIDA DECISÃO RECORRIDA. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.
A ausência de débito nas operações com mercadorias sujeitas à incidência do ICMS implica em falta de recolhimento do imposto devido ou em menor valor do que o exigível, caracterizando infração à legislação vigente.
Nas acusações feitas através de auto de infração, cabe ao contribuinte a prova em contrário, invertendo o ônus da prova para aquele a quem ela aproveita. (grifo nosso)
Dessa forma, depreende-se, do incontestável conhecimento público, reforçado pela vasta jurisprudência a respeito do assunto, que cabe ao contribuinte provar que, das acusações que lhe foram impostas através do lançamento de ofício, consubstanciado pelo auto de infração, não sobram dúvidas a respeito de sua procedência, no mesmo direcionamento em que quer fazer crer em sua reclamação.
Assim, ao contrário do que alegou, o contribuinte não apresentou qualquer prova da alegação de que haveria lançado as notas fiscais relacionadas pela fiscalização nos livros próprios e regulamentares.
No que tange à dosimetria da pena, é de se realçar que, em se tratando de penalidade, há autorização legal expressa – e até constitucional, ainda que lá se refira expressamente à lei penal –, para que se apliquem os mandamentos do CTN, no seu artigo 106:
Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:
I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados;
II - tratando-se de ato não definitivamente julgado:
a) quando deixe de defini-lo como infração;
b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo;
c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática. (grifo nosso)
Tendo sido anulada a acusação já referida, não há que se falar em dupla previsão legal. Na verdade, prospera apenas a aplicação do artigo 85, II, ‘b”, referente à omissão já referida e que foi devidamente aplicada pelo auditor fazendário.
Em outro ponto do recurso, o contribuinte se insurge um suposto nítido caráter confiscatório do crédito tributário. As decisões emanadas desta Corte são convergentes para o entendimento de que constitucionalidade, ou não, foge da competência do Conselho de Recursos Fiscais e de seus Conselheiros, consequentemente, assim como se refere a Conselheira Thaís Guimarães no relatório do Acórdão 19/2019, cujo excerto destaco:
“Relativamente à pretensão da recorrente, para que seja afastada a penalidade aplicada, argumentando que é desproporcional e desarrazoada, cabe ressaltar que foge à alçada dos órgãos julgadores a aplicação da equidade, bem com a declaração de inconstitucionalidade...”
Por isso é que essas questões não são objeto de análise das Cortes de Julgamento Administrativo, como já bem decidido pelo Conselho de Recursos Fiscais, em apreço à observância do que dispõe o artigo 55 e 72-A da Lei n. º 10.094/2013 e do parágrafo único do artigo 1º da Portaria n. º 075/2017:
Art. 55. Não se inclui na competência dos órgãos julgadores:
I - a declaração de inconstitucionalidade;
II - a aplicação de equidade.
Art. 72-A. No julgamento do processo administrativo tributário é vedado afastar a aplicação de lei sob alegação de inconstitucionalidade, ressalvadas as hipóteses em que a inconstitucionalidade tenha sido proclamada:
I - em ação direta de inconstitucionalidade;
II - por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, em via incidental, desde que o Senado Federal tenha suspendido a execução do ato normativo.
Art. 1º O Conselho de Recursos Fiscais - CRF, a que se refere o art. 142 da Lei n° 10.094, de 27 de setembro de 2013, órgão vinculado à Secretaria de Estado da Receita - SER, a quem compete, em segunda instância administrativa, julgar os recursos interpostos contra decisões proferidas em processos administrativos tributários contenciosos ou de consultas, é o órgão colegiado da Justiça Fiscal Administrativa, com autonomia funcional, sede na Capital e alçada em todo território do Estado, representado, paritariamente, pelas entidades e pela Fazenda Estadual.
Parágrafo único. É vedado ao Conselho de Recursos Fiscais deixar de aplicar ato normativo, ainda que sob alegação de sua ilegalidade ou inconstitucionalidade.
Nesse mesmo sentido, já foi também sumulado o entendimento do Conselho de Recursos Fiscais, que na direção de afastar a competência da Corte Administrativa de questões que digam respeito à constitucionalidade, ou não, de matéria, assim como fica claro na Súmula 3, cujo texto vai reproduzido:
DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE - A declaração de inconstitucionalidade de lei não se inclui na competência dos órgãos julgadores administrativos (Acórdãos nºs: 436/2019; 400/2019; 392/2019; 303/2019;294/2018; 186/2019; 455/2019). DECISÃO: DECISÃO: aprovada por unanimidade.
Por todo o exposto,
V O T O - pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e, no mérito, pelo seu desprovimento, para manter, a sentença prolatada na primeira instância, julgando parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.0001483/2017-53, lavrado em 27/6/2017, em desfavor da empresa PANDINE ALIMENTOS LTDA. - EPP, inscrição estadual n° 16.132.229-8, devidamente qualificada nos autos, impondo o ônus decorrente desta ação fiscal, condenando-o ao pagamento do crédito tributário no valor de R$ 321,33 (trezentos e vinte e um reais e trinta e três centavos) referentes à multa por descumprimento de obrigação acessória por infringência ao artigo 85, II, “b”, da Lei n. º 6.379/96.
Ao tempo em que mantenho cancelado o crédito tributário no montante de R$ 2.089,73 (dois mil e oitenta e nove reais e setenta e três centavos), pelos motivos já expostos.
Intimações necessárias a cargo da Repartição Preparadora na forma regulamentar.
Primeira Câmara de Julgamento, sessão realizada por meio de vídeo conferência em 02 de junho de 2020.
ANISIO DE CARVALHO COSTA NETO
Conselheiro Relator
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